quarta-feira, 28 de julho de 2010

Popularização dos e-books

Matéria minha publicada no último sábado:


A popularização dos livros eletrônicos pelo mundo está prestes a mudar paradigmas no mercado editorial. O aumento de leitores que possuem aparelhos Kindle, Nook ou iPad nos Estados Unidos já interferiu nos negócios das maiores lojas desse país. Recentemente, a Amazon divulgou que o número de vendas dos livros digitais já superou o do formato tradicional - nos últimos três meses, para cada cem livros de capa dura, a empresa vendeu 143 livros digitais. Detalhe: títulos gratuitos não foram incluídos nessa conta.


O impacto disso na vida dos leitores e no rendimento das editoras é muito claro. Com os chamados e-readers, as pessoas têm às suas mãos uma praticidade impressionante, pois podem carregar milhares de páginas de livros em um único aparelinho que pesa poucas gramas e pode facilmente ser carregado na bolsa. Por outro lado, as editoras terão de repensar seu sistema de faturamento, porque os valores de seus produtos não vão mais variar de acordo com o material dos livros, já que para os títulos digitais, a única coisa que importa é o conteúdo.
Na véspera do Dia do Escritor, o HOJE EM DIA perguntou àqueles que vivem das obras que produzem se as mudanças tecnológicas podem afetar os seus trabalhos. Afinal, a popularização dos livros eletrônicos também afeta o ofício do escritor?
De acordo com o poeta, ensaísta e contista mineiro Iacyr Anderson Freitas, muitos profissionais das letras devem mudar seu estilo para se adequar às demandas novas que o mercado deve trazer em breve. "Aquele escritor que é voltado para o mercado provavelmente vai mudar sua escrita. Antes, os best-sellers precisavam ter uma grande quantidade de páginas para justificar seus preços, mas isso deve ser alterado pelos livros eletrônicos. Obras com muitas páginas podem ficar cansativos num Kindle e vai ser necessário oferecer ao o leitor uma leitura mais ágil. Com o tempo, os autores vão se adaptar ao novo nicho de mercado dos leitores de e-books", explica.
Mas se o escritor não produz seus livros visando vendas, as novas tecnologias não lhe trarão grande impacto, segundo Freitas. "A literatura que não tem um espelhamento de mercado óbvio, como a poesia e os contos, ainda possui um grande diálogo com a tradição. É claro que vai sofrer algumas modificações com o tempo, mas a velocidade da alteração vai fluir de uma forma mais lenta", afirma.
Para Freitas, os e-books poderão contribuir para a popularização da leitura, já que um título eletrônico pode ser comercializado por poucos reais. Conforme um levantamento do Instituto Pró-Livro, elaborado em 2007, há cerca de 95 milhões de leitores que leem, em média, 1,3 livros por ano.
"Os romances devem ganhar edições primorosas, para ficar nas estantes, mas aqueles manuais que merecem constantes atualizações, os dicionários e os livros de entretenimento certamente vão ser muito apreciados na versão eletrônica", analisa o escritor.
O romancista Pedro Maciel diz que as novas tecnologias já influenciam os trabalhos dos autores. "Recebo e-mails de leitores de todas as partes do país e, às vezes, de outros países. Pode-se dizer que a internet está para os nossos dias assim como a invenção da prensa está para os tempos medievais. Enganam-se os críticos que afirmam que a nova geração não está lendo ou escrevendo. Eles estão lendo e escrevendo mais do que as gerações passadas e também estão revolucionando a língua, já que ela é um órgão vivo e está sujeita à modificações", opina Maciel, que acredita que as próximas gerações não terão mais um grande contato com os livros impressos.
Já a escritora Maria Esther Maciel acredita que o livro de papel ainda terá público cativo por muitos anos. Assim como muitos autores têm uma relação de afeto grande com o objeto livro, boa parte de seus leitores também tem.
"Não dá para prever o que vai acontecer com o livro, mas acredito que os dois suportes (eletrônico e impresso) vão conviver simultaneamente. Eu tenho uma relação importante com o objeto, gosto da textura e do cheiro de um livro. Vejo-o como imprescindível na minha vida. Encaro o e-book como algo que vai contribuir muito para o acesso à literatura, mas isso não vai acabar com o tradicional", conta Maria Esther, que não pretende mudar sua escrita para adequar seus textos à nova realidade dos Ipads e Kindles.
Mas no campo dos livros científicos, as novas tecnologias talvez não tragam tantas mudanças. De acordo com a historiadora Mary del Priore, há barreiras a serem ultrapassadas antes que os e-books científicos ganhem espaço no mercado. Afinal, o próprio meio acadêmico enxerga com preconceito a difusão de conhecimentos para o grande público.
"O crescimento da venda de livros teóricos e de história passa pela ultrapassagem de outros obstáculos. O da linguagem é, talvez, o mais nevrálgico. Nosso maior problema e adequarmos conceitos e conteúdos de forma a difundir horizontalmente o conhecimento. É preciso adequar nosso textos aos usos pedagógicos da internet ajudando a renovar os métodos educativos sobre a disciplina. Para isso a vulgarização do conhecimento histórico é fundamental", explica.
A mudança, segundo ela, não passa pelo mercado editorial, mas sim pelos acadêmicos. "Para vendermos mais livros de história não precisamos de livros eletrônicos, mas de uma linguagem fácil, clara e acessível para multiplicar leitores".
É bom lembrar que, embora já seja uma realidade nos Estados Unidos, o livro eletrônico ainda é artigo de luxo no Brasil. O Kindle, criado pela Amazon, pode ser importado, com impostos, por cerca de US$ 500 (ou seja, algo próximo de R$ 1.000). Mais populares no Brasil, os netbooks (aqueles computadores pequeninos, do tamanho de um caderno) também podem ser boas alternativas para a leitura de e-books.
Para os belo-horizontinos apaixonados por novas tecnologias, uma boa notícia: a rede de livrarias Leitura começa a vender versões em português de livros eletrônicos a partir do início de agosto.

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